Tempos de ebulição
Jane Goodall, naturalista sustenta sua crença positiva no futuro da humanidade
Guerras, epidemias, perda de biodiversidade, desastres climáticos acentuados pelas mãos humanas, desigualdade econômica crescente, insegurança alimentar, polarização e fanatismo político, escravidão moderna, ecoansiedade…Vivemos tempos de ebulição que nutrem angústias cotidianas. Haverá um antídoto contra esses males e a paralisação que geram?
Foi a maneira que utilizamos nosso intelecto que ocasionou as crises, não o intelecto em si. É uma mistura de ganância, ódio, medo e desejo pelo poder que nos leva a utilizá-lo de maneira equivocada. A boa notícia é que um intelecto capaz de criar armas químicas e inteligência artificial também consegue inventar maneiras de curar o mal que fizemos a esse pobre planeta.
Jane Goodall – primatologista e naturalista
Jane Goodall Institute
Com mais de oito décadas de vida e uma jornada ímpar pela conservação, Jane Goodall cresceu durante a Segunda Guerra Mundial, aprendeu sobre a morte e como a natureza humana pode ser cruel e brutal, ao mesmo tempo que amorosa, compassiva e corajosa.
Seu trabalho pioneiro mudou a forma como percebemos nossos parentes mais próximos do reino animal, os chimpanzés. Incansável, foi decisiva na pressão contra o uso de primatas como cobaias em laboratórios e na conscientização ambiental de milhares de pessoas pelo globo. Por meio do instituto, viaja inspirando plateias em diferentes países a proteger o planeta que compartilham. Ação, diz ela, é base de sua esperança, e um antídoto.
Livro da Esperança: um guia de sobrevivência para tempos difíceis
Neste livro compartilha sua jornada de vida e lições aprendidas, elenca razões que sustentam sua crença positiva no destino da humanidade e nos servem de lição: o surpreendente intelecto humano, a resiliência da natureza, a energia e comprometimento da juventude e o indômito espírito humano.
Da mesma forma que o homem promove a barbárie também se destaca por atos de altruísmo únicos. Nós, humanos, ajudamos o outro mesmo que isso não traga nenhum impacto positivo óbvio para nossa vida. O ser humano precisa perceber que só conseguirá atingir completamente seu potencial se “a cabeça e o coração trabalharem juntos”. Este é o verdadeiro Homo sapiens, homem sábio. E um passo necessário é aplicar essa sabedoria para enfrentar quatro grandes desafios: diminuir a pobreza; reduzir o estilo de vida insustentável dos mais ricos; eliminar a corrupção e encarar os problemas causados por uma população mundial crescente e os rebanhos de animais. Não faltam bons exemplos: energia renovável, agricultura regenerativa e permacultura, dieta mais baseada em plantas, entre outras alternativas que respondem à urgente necessidade de diminuirmos nossa pegada ecológica na Terra.
Jane Goodall – primatologista e naturalista
Resiliência da natureza
A natureza é uma escola de resiliência. Em ecologia, ser resiliente significa ter a capacidade de se recuperar após perturbações ou mudanças significativas e imprevisíveis no ambiente, como aquelas causadas por incêndios, enchentes, secas, nevascas ou ataques que ferem as estruturas. “Achamos que somos mais espertos do que a natureza, mas não somos, e precisamos ter humildade e reconhecer que existe uma inteligência superior na natureza”, crava. Aprender com a resiliência do meio ambiente frente às intempéries é uma forma de nos reconectarmos com a sabedoria da natureza.
Um mês após 11 de setembro de 2001, dia do colapso das Torres Gêmeas, em Nova York, uma pereira foi descoberta esmagada entre blocos de concreto por uma funcionária da equipe que estava limpando os escombros. Tudo que tinha restado eram metade do caule e raízes queimadas. Mas havia um galho vivo. Depois de passar um longo período de recuperação em um centro de jardinagem, ela ficou saudável o bastante para ser plantada no que hoje é o Memorial e Museu do Onze de Setembro. Durante a primavera, ela floresce e leva muita gente às lágrimas. Foi batizada de “A Árvore Sobrevivente”. Outro exemplo singular que Jane cita em seu livro é o de duas árvores de cânfora de mais de 500 anos de idade que sobreviveram à bomba atômica de Nagasaki, no Japão, consideradas por muitos japoneses seres sagrados.
O indômito espírito humano
Cada um tem sua definição de espírito, a depender da criação, educação, religião ou crenças pessoais. Para Jane, é uma força energética. “Uma força interior que provém da sensação que tenho de estar conectada ao grande poder espiritual que sinto com tanta força, principalmente quando estou em meio à natureza”, conta. Ela também fala em uma centelha de vida que anima todas as coisas viventes da Terra, do menor dos insetos à maior das árvores. Vem dessa energia onipresente, também, a sua quarta razão para nutrir esperança em tempos melhores: o que chama de indômito espírito humano.
Poder dos jovens
Apesar de serem os que menos contribuem com a alta do termômetro mundial, os jovens serão aqueles que mais sofrerão as consequências da crise climática em um futuro envolto em previsões sombrias. Esse grupo tem arregaçado as mangas e lutado por mudanças como poucos. Exemplos de ativismo jovem se alastram pelo mundo, e este é um motivo de esperança para Jane Goodall, que há anos se dedica a projetos de educação infantojuvenil em comunidades pobres pelo mundo. O acesso à educação é, segundo ela, ponto-chave para enfrentar a crise ambiental.
É a qualidade em nós que nos faz enfrentar o que parece impossível, e jamais desistir. Apesar do escárnio e da zombaria dos outros, apesar do possível fracasso.
Jane Goodall – primatologista e naturalista
Fonte: Um Só Planeta – Vanessa Oliveira